Emprego com carteira segue abaixo de trabalho informal e por conta própria em 2018

15-02-2019

Queda do desemprego desde 2017 vem sendo puxada pelo crescimento do trabalho informal e por conta própria, enquanto emprego com carteira ainda mostra fraqueza

Mesmo com o saldo de criação de vagas de emprego formal voltando ao campo positivo, a soma de pessoas trabalhando por conta própria ou no mercado informal seguiu acima da quantidade de empregados com carteira assinada em 2018.

O número de trabalhadores sem carteira assinada cresceu 3,8% (mais 427 mil pessoas) no 4º trimestre de 2018, frente ao ano anterior, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada nesta quinta-feira (31). Por outro lado, a quantidade de pessoas que trabalham com registro caiu 1% na comparação anual.

Ao final de 2018, o Brasil tinha 33 milhões de pessoas trabalhando com carteira assinada (sem considerar empregados domésticos). Outras 11,5 milhões estavam atuando sem carteira, e outras 23,8 milhões, por conta própria.

Os dados do Instituto Brasileiro Geografia Estatística (IBGE) desde 2012 mostram que o emprego formal foi ultrapassado pela soma entre postos sem carteira e por conta própria pela primeira vez em 2017.

Desde então, a diferença só vem crescendo. Se considerados os trabalhadores domésticos, o total de empregados com carteira assinada passou a ser menor que o dos demais trabalhadores em 2015.

O economista Sérgio Firpo, professor do Insper, explica que os números refletem a readaptação do mercado de trabalho após as perdas da crise, em meio a um cenário de recuperação mais lento do que o se esperava.

“A timidez do crescimento da economia faz com que a gente não tenha o crescimento das vagas formais que a gente gostaria”, comenta o professor, acrescentando que o mercado ainda não conseguiu gerar vagas suficientes para que todos aqueles que perderam seus empregos durante a crise possam retornar ao mercado formal.

“Tem vários trabalhadores que gostariam de estar no setor formal e não estão, mas a pessoa tem que se virar. E faz isso aceitando um emprego sem carteira ou tendo que trabalhar por conta própria”, diz Firpo.

No entanto, o professor acrescenta que, apesar de se mostrar muitas vezes como alternativa ao desemprego, o crescimento do número de pessoas trabalhando por conta própria (ao contrário do trabalho informal) também pode apontar fatores positivos.

“O crescimento de trabalho por conta própria só acontece porque tem alguma demanda. Ninguém vai montar um negócio se não tiver gente disposta a comprar. É um sinal de que a economia está se movimentando, mesmo que o crescimento não venha na velocidade que a gente gostaria.”

Do emprego formal ao trabalho por conta própria

Após ser demitido da empresa em que trabalhava como analista de sistemas havia 10 anos, Antonio Rogério Rodrigues Maciel abriu um pequeno negócio – um centro de tratamentos terapêuticos e restaurante vegano. A demissão aconteceu em junho de 2018, e o negócio foi inaugurado 6 meses depois.

“Eu vinha me atualizando com cursos holísticos, e tinha uma clientela. Tinha o emprego em horário comercial e, fora do horário, atendia pessoas com massagem, acupuntura e por aí vai”, lembra Antonio, que passou a se dedicar integralmente a essas atividades após a demissão.

O negócio de Antonio não reflete os dados do IBGE apenas sobre o trabalho por conta própria, mas também sobre o informal. Isso porque, para ajudá-lo nos serviços, ele contratou três funcionários, mas sem registro em carteira. Ele conta que tem a meta de registrá-los, mas cita dificuldades.

“Eu tenho duas pessoas que ajudam na cozinha e uma terceira na recepção. É informal, porque ainda não me estabeleci para conseguir amparar as pessoas como é necessário”, conta Antonio. “A gente sabe que no começo demora. É um trabalho que depende de clientes, investimento em propaganda”, reconhece.

No entanto, Antonio está otimista. “Estou muito feliz. Adoro o que eu faço”, diz.

Perspectivas

A expectativa dos economistas para 2019 é que o país siga criando vagas formais de trabalho, mas ainda não o suficiente para recuperar a quantidade de vagas perdidas com a crise.

O economista Roberto Luis Troster explica que um dos fatores que impede uma recuperação mais rápida do mercado de trabalho formal é “conjuntural”, já que, com a crise, a demanda por produtos e serviços cai e a necessidade de mão de obra diminui. E, embora o consumo tenha mostrado sinais de recuperação, ainda não cresce de forma robusta.

“Houve o aumento de desempregados por conta da pressão da crise, mas se a gente não muda a competitividade das empresas, isso vai continuar”, acrescenta Troster.

Os economistas apontam ainda a necessidade de aprovação de reformas econômicas para restaurar a confiança de investidores para criar empregos. “O crescimento depende bastante de os investidores perceberem que o Brasil está numa trajetória sustentada e não vai ter uma explosão de dívida lá na frente”, diz Firpo.

Troster destaca, no entanto, que mesmo com as reformas em andamento, a velocidade da recuperação do mercado de trabalho deve ser lenta. “Sempre tem uma defasagem. Quando recomeça a atividade econômica, demora um tempo para reduzir o desemprego – da mesma forma em que, na crise, o desemprego demora mais para começar a crescer”, lembra o economista.

Fonte: Portal G1 – 31.1.2019